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sábado, 26 de fevereiro de 2011

ADVOGADO É REALMENTE DOUTOR?



Essa é uma questão muito discutida na sociedade e no mundo acadêmico. Ontem mesmo foi motivo de debates na minha sala. Obviamente houve divergências. Claro que cada um tem sua opinião, respeito isso, porém, sempre procuro me aprofundar nos assuntos que me interessam, e pesquisando, descobri que a  afirmativa da pergunta em questão tem fundamento. Um Decreto Imperial ( DIM ), de 1º de agosto de 1825, pelo Chefe de Governo Dom Pedro I, deu origem a Lei do Império de 11 de agosto de 1827, que criava dois cursos de Ciências Jurídicas e Sociais. O regulamento do referido estatuto para o curso jurídico, dispõe sobre o Título (Grau) de doutor para o advogado. Descobri também que o  Decreto n.º. 17874ª, de 09/08/1927,  declara feriado o dia 11/08/1827, data em que se comemora o centenário da criação dos cursos jurídicos no Brasil. O silogismo é simples, a  Lei do Império criou o curso e em seu bojo afirmou que os acadêmicos que terminassem o curso de Direito seriam bacharéis. O título de Doutor seria destinado aos habilitados nos estatutos futuros (como o Estatuto da OAB, hodiernamente usado). Acrescenta que somente Doutores poderiam ser lentes (do Latim Legente), ou seja, professores. Assim, tendo o acadêmico completado seu curso de direito, sido aprovado e estando habilitado em Estatuto competente teria o Título de Doutor.

Há quem conteste a  referida Lei do Império, e alegue para tal, que não vigoravam os princípios republicanos e que os títulos serviam para criar diferenças entre os indivíduos, como se alguns merecessem mais respeito ou fossem mais dignos simplesmente por ostentarem algum título ou pertencerem a determinada classe. Tal cenário não se coaduna com a atual Carta Constitucional. Ademais, não havia em tal época curso de doutorado, o que justificaria, naquele momento, a utilização do título de doutor conforme dispunha a Lei Imperial. Resta evidente que o contexto atual difere bastante do de então. Do ponto de vista técnico podemos considerar o seguinte:
O art. 9o da Lei do Império de 1º de agosto de 1825 foi tacitamente revogado pelo art. 53, VI da Lei de Diretrizes Básicas, que garante às universidades a atribuição de conferir graus, diplomas e outros títulos. Além do mais, é óbvio que esse decreto jamais poderia ter sido recepcionado pela Constituição de 1988 por sua afronta ao princípio da igualdade. Bem, o Principio da Igualdade (caput do art. 5º da nossa Constituição Federal) é um desafio a inteligência dos juristas, pois é necessário antes, determinar os conceitos de "iguais" e "iguais perante a lei". Assim, cumpre como papel do jurista a interpretação  do conteúdo dessa norma, tendo em vista a sua finalidade e os princípios consagrados no Direito Constitucional, para que desta forma o princípio realmente tenha efetividade.

Quanto à origem da palavra, se considerarmos que doutor é quem defende uma tese, então seriam doutores todos os que defendem tese em conclusão de curso (bacharelados), em iniciação científica ainda na graduação, nas tribunas das câmaras de vereadores, assembléias legislativas, Câmara dos Deputados, Senado. Teríamos que chamar de doutor todos os que defendem teses como, por exemplo, os economistas. Os próprios padres, pastores e outros religiosos de maneira geral também defendem teses e causas. 

Assim, só é doutor quem tem um diploma universitário de doutor? O que você acha?

Doutor provém do latim docere (“ensinar”). Os “doutores da lei” ensinavam a lei hebraica. Na Idade Média, doutor era quem estava apto a lecionar. Doutoramento (português europeu) ou doutorado (português brasileiro) é um grau acadêmico concedido por uma instituição de ensino superior universitário, que pode ser uma universidade, um centro universitário, uma faculdade isolada ou até mesmo um hospital (como o Hospital Antonio Prudente, referência mundial no estudo de câncer), que tem o propósito de certificar a capacidade do candidato para desenvolver investigação num determinado campo da ciência (no seu conceito mais abrangente).

Neste grau acadêmico espera-se que o aluno adquira capacidade de trabalho independente e criativo. Esta capacidade deve ser demonstrada pela criação de novo conhecimento e será validada por publicações em bons veículos científicos ou pela obtenção de patentes. É essencial para a seleção ao doutorado a demonstração de qualidades e experiência em pesquisa. Um bom currículo acadêmico na graduação é condição indispensável.

No Brasil, somente têm validade nacional os doutorados obtidos em cursos recomendados pela CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Títulos obtidos no exterior precisam ser reconhecidos por programas recomendados pela CAPES, conforme o art. 48 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. É equivalente ao PhD (Philosophiæ Doctor) atribuído nas universidades anglo-saxônicas.

Como vimos, o título de “Doutor”, deve ser expressamente outorgado por uma instituição de ensino reconhecida pelo MEC e recomendada pela CAPES, que é responsável pela expansão e consolidação da pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) em todos os estados da Federação.

Há no consuetudinário um subentendido de que o indivíduo formado em Direito possui regular sabedoria, uma vez que o curso de direito é considerado um curso nobre, dentre outros, que tratam de disciplinas e assuntos sociais abrangentes.

Um advogado me disse hoje que mais importante que o título é o conhecimento, e este ninguém obterá simplesmente ostentando "duas letras" antes do nome.

E disse também que existe profissionais (advogados) que, após um curso de graduação, normalmente com duração de 5 anos, que já se intitulam doutores. Por outro lado, tem aquele profissional que cumpriu sua graduação, de igual ou maior duração que o supra citado, e que ainda galgou conhecimento acadêmicos em um mestrado (2 anos) e doutorado (4 anos), totalizando algo em torno de 10 anos de formação acadêmica.

A premissa acima nos faz concluir de que a formação destas duas pessoas foi, sem sombra de dúvida, distinta.

Conversar com ele me fez observar que o grande problema é se usar o mesmo adjetivo para designar o título honorífico e a profissão jurídica.  

Por isso, cito como exemplo a decisão do juiz Alexandre Eduardo Scisinio, da 9ª Vara Cível de Niterói, que julgou a causa de seu colega no RJ sobre o pretenso tratamento que foi preterido pelo porteiro de seu prédio: 

"Urge ressaltar que tratamento cerimonioso é reservado a círculos fechados da diplomacia, clero, governo, judiciário e meio acadêmico, como já se disse. A própria Presidência da República fez publicar Manual de Redação instituindo o protocolo interno entre os demais Poderes.Mas na relação social não há ritual litúrgico a ser obedecido. Por isso que se diz que a alternância de “você” e “senhor” traduz-se numa questão sociolingüística, de difícil equação num país como o Brasil de várias influências regionais"

Ressalte-se, que a sentença somente afirma que o título não se cumpre ao uso na relação social. E isso não implica em tratamento diferenciado, muito menos em status diferenciado. Títulos acadêmicos não são pronomes de tratamento, devendo ter seu uso restrito ao mundo acadêmico e quando estritamente necessário. 

A palavra "Doutor" tem dois únicos significados e, conseqüentemente, deveria ser empregada somente nos casos a eles pertinentes: "médico", por tradição, ou um determinado grau de estudo universitário obtido em uma especialização além do bacharelado. Contudo, o emprego indevido de "Doutor" é comum entre as pessoas mais humildes e sem instrução, e por funcionários mal preparados, que associam a palavra Doutor a um status social ou a um nível de autoridade superior ao seu. Essas velhas divisões não são condizentes com a democracia.

É necessário lembrar que não existe lei que obrigue uma pessoa comum a tratar uma outra por Doutor. Esse tratamento só é obrigatório nos meios acadêmicos para aqueles que fizeram defesa de tese.

Quando estabelecer um novo relacionamento, limite-se ao uso de "Senhor", e não utilize "Doutor", exceto numa relação profissional, se “assim desejar”, caso esteja sob os cuidados de um profissional formado, como o advogado por exemplo.









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